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Quando a polêmica faz parte do plano

Na era digital, em que ser ignorado é mais perigoso do que ser criticado, atrair atenção pode ser uma vantagem estratégica. A recente decisão da Jaguar de revisar sua conta global de publicidade após a repercussão negativa de seu rebranding gerou questionamentos importantes sobre o futuro da marca e sua comunicação.

Apesar do movimento, é fundamental destacar que a Jaguar anunciou uma possível troca de agência, mas não indicou nenhuma mudança em seu posicionamento. Isso mostra que estratégia e execução são coisas distintas. Enquanto uma nova agência pode trazer abordagens diferentes, a visão da marca permanece firme.

Vamos analisar os motivos por trás da decisão da Jaguar, discutir os desafios e aprendizados de processos de rebranding em setores tradicionais como o automotivo e refletir sobre como a polêmica pode, muitas vezes, ser parte da estratégia.


O caso Jaguar e a campanha “Copy Nothing”

Em dezembro de 2024, a BOND publicou um artigo intitulado “Jaguar: A Estratégia por Trás da Polêmica”, onde defendeu que a nova identidade visual da Jaguar, apesar das críticas iniciais, fazia parte de uma movimentação intencional da marca.

O slogan “Copy Nothing”, a estética ousada com modelos performáticos e a ausência de carros no comercial geraram reações negativas nas redes sociais. O modelo elétrico em tom rosa foi comparado a brinquedos ou eletrodomésticos, e a substituição do ícone tradicional do jaguar por um novo símbolo tipográfico dividiu opiniões. Mas será que isso significa fracasso?


Mudança de agência não significa mudança de posicionamento

A Jaguar Land Rover iniciou um processo de revisão da conta criativa global, atualmente gerenciada pela Accenture Song e sua agência interna, Spark44. Mesmo com contrato vigente até 2026, a marca está reavaliando sua parceria.

No entanto, em nenhum momento foi comunicado que a Jaguar vai abandonar sua estratégia de reposicionamento. A mudança está na forma de execução, e não no conteúdo da estratégia. Isso é comum em grandes empresas que passam por momentos de transição ou enfrentam desafios de comunicação.

Trocar de agência pode significar buscar novos formatos, novos olhares e maior conexão com públicos-alvo, sem necessariamente mudar os objetivos de mercado.


O papel do rebranding em momentos de transformação

O rebranding da Jaguar pode parecer radical, mas está alinhado a uma realidade maior: o setor automotivo passa por uma revolução sem precedentes. A eletrificação da frota, a ascensão dos carros autônomos, a digitalização dos painéis e o avanço de novas marcas globais, como as chinesas BYD e NIO, mudaram as regras do jogo.

Nesse novo contexto, marcas tradicionais como Jaguar precisam se reinventar para se manter relevantes. E essa reinvenção não pode ser feita apenas com ajustes estéticos. É preciso coragem para questionar símbolos antigos, testar novos formatos e assumir riscos. Nem todos vão aprovar. Mas, para quem busca construir o futuro, a unanimidade não é um objetivo.


Entender o novo luxo: o cliente está mudando

O novo consumidor de carros de luxo não está mais interessado apenas em desempenho e status. Ele busca design, tecnologia, consciência ambiental e conexão com o seu estilo de vida. A Jaguar parece ter entendido isso.

Ao reposicionar sua marca com foco em um público mais jovem, urbano e conectado, a empresa assume um novo papel. Em vez de ser uma marca clássica e previsível, quer ser percebida como provocadora, inovadora e culturalmente atualizada.

Exemplos não faltam. A Burberry fez isso na moda. A Apple abandonou conectores antigos e lançou produtos com visual limpo e diferenciado. A Tesla também foi criticada por sua estética futurista, mas acabou virando sinônimo de inovação.


Reação negativa nem sempre é fracasso

O que muitos veem como rejeição pode, na verdade, ser parte de uma estratégia bem planejada. No branding, o pior que pode acontecer é ser ignorado. A controvérsia gera discussão, atrai olhares e, com o tempo, pode se transformar em admiração.

O lançamento do modelo Type 00 durante a Miami Art Week foi um bom exemplo de como unir comunicação, cultura e produto. Primeiro, a marca provocou. Depois, apresentou um carro alinhado à nova identidade, consolidando sua proposta em um evento que dialoga com inovação e luxo.


A concorrência está cada vez mais agressiva

Enquanto a Jaguar tenta reformular sua imagem, marcas chinesas como BYD, XPeng e NIO avançam no mercado europeu com modelos elétricos altamente competitivos, tanto em preço quanto em tecnologia. O risco de não se mover é maior do que o risco de errar.

Essa pressão obriga marcas como Jaguar a se antecipar. O rebranding pode ser visto como uma forma de se posicionar frente à transformação, preparando terreno para um portfólio mais exclusivo, com preços altos e margens maiores.


Lições para outras marcas: estratégia exige coragem

O que podemos aprender com a Jaguar? Que em tempos de ruptura, ser tradicional pode ser um fardo. As marcas precisam se atualizar, conversar com novos públicos e ter coragem para experimentar. Não se trata de ignorar a tradição, mas de reinventá-la.

Mudar a comunicação é só uma parte do processo. A entrega do produto, o posicionamento, a experiência e a consistência no discurso são essenciais para que o rebranding não seja apenas cosmético, mas um pilar real de transformação de marca.


Mude ou Morra

A Jaguar está no meio de um processo profundo de reposicionamento. A mudança de agência pode indicar a necessidade de ajustar o tom, o ritmo ou a forma de se comunicar. Mas o conteúdo da estratégia permanece claro: tornar-se uma marca de luxo moderna, provocativa e relevante na nova era dos veículos elétricos.

As críticas, longe de serem um obstáculo, podem ser uma alavanca. E a principal lição aqui é que, em mercados saturados e competitivos, não é preciso agradar a todos. É preciso ser memorável para quem realmente importa.